terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Nick Cave fez o melhor rock de 2008




Tá certo... 2008 foi talvez um dos anos em que menos ouvi rock. Colaborei na Comissão Organizadora do Festival Botucanto, passei a produzir e apresentar o Arquivo Musical Brasileiro pela Rádio Emissora de Botucatu (todas as sextas, a partir das 20h), ou seja, projetos muito ligados à música popular brasileira.
Nessa virada de ano, ao procurar as listas de melhores do ano, me dei conta de que só tinha um dos CDs que andaram frequentando a maioria das listas dos críticos de rock. Na verdade, a maioria dos discos citados é de bandas novas, pouco conhecidas e independentes. Hoje, porém, com as facilidades da internet, não dá pra usar essas coisas como desculpa. O fato é que ouvi pouco rock no ano que passou e quando ouvi procurei os clássicos: Dylan, Neil Young, alguma coisa de blues...
Não é à toa que o tal do CD que eu ouvi e que consta das coletâneas é de um veteraníssimo surgido nos porões enfumaçados dos anos 80, o grande Nick Cave. “Dig, Lazarus, Dig!” foi o melhor disco de rock que ouvi, dentre os lançados em 2008. Meu queixo ainda cai cada vez que ouço o disco, e olha que sou fã de longa data do cara. Acho sinceramente que “Dig” é um dos seus melhores, o que não é pouca coisa numa discografia sólida como a do “senhor caverna”.
O disco tem a atitude e o tom lúgubre que marcam toda a carreira de Cave, mas há uma algo mais. Sua banda, os Bad Seeds, nunca soou tão quente, tão rock´n roll. O clima pesado, a distorção e o desconforto fazem parte do DNA de Cave. Mas alguns elementos enriquecem as músicas tornando-as às vezes mais interessantes ritmicamente, como o riff e o coro da faixa-título, outras mais etéreas como a sonoridade de teclados e guitarra de “Jesus of the Moon”, que me fez lembrar coisas do “Time Out of Mind” do Dylan, aquele som de cabaré decadente à meia luz. E o que dizer do casamento estranho de percussão, teclado e guitarra em “Moonland”.
Outra das minhas preferidas é “Today´s Lessons” que às vezes parece anos 80 com seus tecladinhos cafajestes, às vezes parece moderna demais com seu ritmo contagiante. Lembrou-me alguns rocks dos Stooges e “Rock´n Roll” do Velvet Underground. Aliás, a personagem da música também é uma Jane qualquer.
“Albert Goes West” é outra com uma pegada em alta voltagem em que Cave convida “Do you wanna dance? / Do you wanna move”, mas admite que não responde por seus atos. Destaque para a percussão canalha e para os backing vocals com direito até a um “shala-la-lá” emoldurado por guitarras distorcidas. Aliás, os backings vocals bizarros são uma atração à parte do Cd. Eles aparecem novamente, brigando para não serem soterrados pela cozinha e pelas guitarras em “We Call Upon the Author”.
O CD termina com os quase oito minutos, quase suaves de “More News From Nowhere”. Mais uma crônica sobre como os seres humanos podem ser estranhos, na escola em que Cave aprendeu com Lou Reed, Leonard Cohen e outros bardos do lado amargo do rock´n roll.
Recomendo “Dig, Lazarus, Dig!” pra quem gosta de rock adulto que fala de amor, morte, drogas, sexo, beleza, tristeza e caos urbano embalado por um som que reflete o que o rock tem de melhor como agressividade, barulho, experimentação, ousadia, riffs poderosos e hipnóticos, refrões legais e nada, absolutamente nada de pretensões virtuosísticas e do bom mocismo que infecta o rock atual. Para iniciados.

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