sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Minhas flores do mal

Minhas flores do mal começam com uma pequena angústia matinal. Não consigo me lembrar o que sonhei, mas sei que havia uma mulher num vagão da transiberiana. O que por si só já motivaria um poema com vodka. Mas deixou apenas uma gripe e um inútil desentupidor nasal.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Definição de amor

O Amor é finalmente
um embaraço de pernas,
uma união de barrigas,
um breve tremor de artérias.
Uma confusão de bocas
uma batalha de veias,
um rebuliço de ancas,
quem diz outra coisa, é besta.

Gregório de Matos Guerra - o boca do inferno

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

HELL´S ANGELS



Califórnia, fim de semana do Dia do Trabalho... Bem cedo, com a neblina do oceano ainda nas ruas, motoqueiros fora-da-lei usando correntes, viseiras e calças Levi´s ensebadas saem em número cada vez maior de garagens úmidas, lanchonetes 24 horas e apartamentos abandonados usados por apenas uma noite em San Francisco, Hollywood, Berdoo e East Oakland, seguindo rumo à península de Monterrey, ao norte do Big Sur... A Ameaça está solta novamente, os Hell´s Angels, a preciosa manchete de jornal, correndo e fazendo barulho na estrada de manhã cedo, sentados nos bancos baixos, ninguém sorri, amontoando-se como loucos no meio do trânsito e passando pela pista do meio a 140 km por hora, tirando várias finas... como Genghis Khan num cavalo de ferro, um corcel monstruoso com um ânus faiscante, passam fulminantes por você e sobem pelas pernas de sua filha sem pedir licença. Mostram um pouco de classe para os caretas, uma dose daquilo que eles nunca vão poder experimentar. Ah, esses caras gente boa, eles adoram sair costurando o trânsito... Little Jesus, Gimp, Chocolate George, Buzzard, Zorro, Hambone, Clean Cut, Tiny, Terry o Vagabundo, Frenchy, Moudly Marvin, Mother Miles, Dirty Ed, Chuck o Pato, Fat Freddy, Filthy Animal, Charger Charley o Molestador de Crianças, Crazy Cross, Puff, Magoo, Animal e pelo menos mais uns cem... loucos para entrar em ação, cabelos compridos ao vento, barbas e bandanas balançando, brincos, sovacos, chicotes de corrente, suásticas e Harley-Davidsons depenadas refletindo o brilho cromado enquanto o trânsito da 101 dá passagem, nervoso, à formação de motos que lembra o estrondo de um trovão indecente...


Assim começa “Hell´s Angels: medo e delírio em duas rodas” do mestre gonzo Hunter S. Thompson na tradução de Ludmila Hashimoto.
O primeiro livro do doutor Thompson é espetacular. Não é só porra-louquice como muitos pensam. O doutor é observador arguto e um comentarista impiedoso das contradições da América doentia. Considerações sobre os Angels, seus costumes, suas origens, sua confusa ideologia, a relação com a mídia... tudo muito legal. Às vezes, uma curtição só, como nos relatos sobre as brigas ou no capítulo sobre as motos infernais dos Angels. Outras, um soco no estômago como no capítulo sobre a relação da gangue com as mulheres e os freqüentes estupros. Foi lançado no Brasil pela Conrad. Imperdível.
Além de escrever como um demônio Hunter Thompson era um fotógrafo de talento, o que poucos sabem. A foto desse post é dele. Mais fotos no link: http://www.mbfala.com/artists/_Hunter%20S.%20Thompson/_other%20works/
Aliás, vale a pena vasculhar as fotos do site http://www.mbfala.com .Muita coisa legal.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Sin City


Revi esse também. Acho que é a melhor adaptação de quadrinhos que já foi feita.
Fantástico! Rever filmes que você gosta é um prazer diferente. Você fica esperando a sua sequencia preferida e assiste com calma. Rever filmes e reler livros é um prazer muito especial.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Jatos de energia retilíneos

1
Você não pode me alcançar
Na espiral da elipse curta do abismo material,
Na textura da anti-gênese dos chips infecciosos,
Ou coisa parecida.

2
Queimem, edifiquem, impermeabilizem,
Vomitem, explodam seus estômagos,
Dilacerem seus cus
Fodam-se todos.
Eu fico aqui, no alto da laje.
Contando as horas e ouvindo rock e blues.

3
Um estouro em compasso binário,
Um caderno e meia dúzia de santos no fundo do armário

4
Sempre aos domingos, sempre nas planíces concretadas e cinzentas,
Um herói subterrâneo voa com sua capa asfáltica,
Sua tez/casca de teflon, onde a gordura das lixeiras e dos animais em decomposição não gruda.

5
Termino dizendo SIM
Como a escada da Yoko
Enterrada no jardim.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

21 Gramas



Tesão de filme. Revi neste final de semana. Bela reflexão sobre amor, morte, escolhas e destino. Tinha esquecido de como a atuação do Benicio del Toro é fudida. Estou muito curioso para vê-lo interpretar o Che. Vamos ver se Hollywood dá conta de tratar um personagem tão complexo como o guerrilheiro argentino com o mínimo de cuidado.
Voltando a "21 Gramas", Sean Penn também está ótimo. Os coadjuvantes também mandam muito bem: Naomi Watts, o pastor, a mulher do Sean Penn.
Outro charme de "21 gramas" é a montagem esperta. Também gosto da fotografia e da trilha sonora. Filmaço.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Carrossel de melancolia

A cidade é um fragmento.
Um não-lugar.
Um parque confuso, hostil e chuvoso
Onde crianças entediadas
Montam cavalinhos estéreis
E giram com vertigem,
Indecisas e perplexas.
Plasticamente.
A dois palmos do chão.
Rumo a lugar nenhum.

sábado, 1 de novembro de 2008

Depoimento

que estava voltando de uma livraria e ia em direção ao seu carro, estacionado a duas quadras dali; que não conhecia a vítima; observou que a vítima parecia estar embriagada, pois falava sozinha e lavava o rosto e os braços na enxurrada; que em momento algum foi abordado ou molestado pela vítima, achando até que não foi visto por ela; que passou por ela a caminho do carro e achou que a vítima era um indigente, bêbado e abandonado pela rua; que foi até seu carro, estacionado a aproximadamente cem metros dali, onde guardou os livros que havia comprado e pegou um cano de ferro que trazia no porta-malas do carro; que obteve o cano de ferro na demolição da casa de sua avó; que o instrumento está em sua posse há aproximadamente dois meses e meio; que se aproximou da vítima sem que ela percebesse; que antes disso, examinou a região e lhe pareceu que não havia ninguém olhando; que o local é mal iluminado e pelo fato da vítima estar próxima de uma árvore, o local estava ainda mais escuro; que a vítima não percebeu sua aproximação; que se posicionou atrás da vítima que permanecia agachada com as mãos mergulhadas na água da enxurrada; que desferiu dois golpes na cabeça da vítima utilizando-se do cano de ferro; que o primeiro golpe foi dado com bastante força e o segundo acertou de maneira menos intensa em razão do movimento gerado pelo primeiro golpe; que a vítima caiu na enxurrada sem emitir qualquer som; que o depoente ficou muito nervoso e foi para seu carro onde ficou sentado esperando a chegada da polícia; que não sabe quem viu a ação, mas acredita que tenha sido algum porteiro ou morador dos prédios da rua; que não se certificou se a vítima veio a óbito ou não; que sua intenção não era cometer homicídio, mas sim cometer algum crime, mesmo que fosse tentativa de homicídio ou lesão corporal; que sua intenção é apenas ficar preso; o depoente acredita que, por ter curso superior, poderá ficar numa cela especial e aí vai ter tempo para ler todos os seus livros; que, em razão do seu trabalho no escritório de contabilidade do tio não tem tempo de ler tanto quanto gostaria; que gosta de se imaginar vivendo a vida dos personagens; que assim que for preso pretende ler alguns livros de Eça de Queirós que ainda não leu; que também pretende reler a obra de Guimarães Rosa e Machado de Assis outros autores que gosta como Jorge Amado, João Cabral de Melo Neto, Cervantes e outros; que não se inspirou em nenhum livro em especial para cometer o crime; que adora a poesia de Drummond, Manuel Bandeira e Fernando Pessoa; que não está arrependido; o depoente perguntou ao delegado quando poderá receber seus livros na cadeia; que lhe foi respondido que ele não tem o direito de perguntar nada durante o interrogatório.