domingo, 2 de junho de 2013

“Amsterdã Blues” e o ano da graça de 1986

Comecei a ler o livro “Amsterdã Blues”, de Arnon Grunenberg, que caiu nas minhas mãos meio por acaso, e tô gostando pra caramba. É um daqueles livros autobiográficos sobre a juventude. No caso do autor, um holandês de família judaica, rebelde e meio sem rumo na vida, observador sarcástico da mediocridade escolar, familiar... enfim...dá te pra sacar qual é a do livro, não? Mas o texto e ótimo. Estou na página 75 e, até agora, o belo namoro/amizade em tom de descoberta do autor/personagem com a fascinante Rosie tem sido uma bela descrição dos tormentos e da confusão do fim da adolescência. O engraçado da história é que o personagem parece ter mais ou menos a mesma idade que eu. Percebi isso quando ele fala sobre a Copa do México, em 1986. Ele e seus amigos brincavam de futebol e torciam pelo Maradona. É mais ou menos a mesma fase que eu vivi, tirando, é claro, o fato do cara ser holandês e eu ser brasileiro. Era impossível um garoto brasileiro de 13 anos, em 1986, torcer para a Argentina. Até nos impressionávamos com a categoria de Maradona. Mas torcer? Jamais. E nem precisávamos. A Holanda não se classificou para a Copa de 86. Já o Brasil estava entre os favoritos. E apesar de já não ser o futebol fantástico de 82, ainda estavam lá Sócrates, Zico, Careca, Falcão, além do mestre Telê. 86 foi a Copa do Maradona. Mas foi também a do maluco e genial Josimar com seus dois golaços assombrosos nos seus dois primeiros jogos com a camisa de seleção. Teve o drama do Zico e o pênalti perdido, que só deu um tom dramático e épico para a coisa toda. Para um são-paulino como eu, era muito mais envolvente do que essa bosta de Copa superfaturada de 2014. Tínhamos Careca, Silas, Müller, Sidney, Oscar e Falcão entre os convocados. Não lembro se o goleiro Gilmar foi para a Copa. Ainda tinha o divino Dario Pereyra na seleção do Uruguai. Nem vou falar dos injustiçados Zé Teodoro e Nelsinho, ótimos laterais que ganharam uma porrada de títulos com o tricolor e tiveram poucas chances na seleção. Não é à toa que o clube foi campeão brasileiro naquele ano. Era outro espporte. Nós torcíamos de verdade. O futebol não era essa merda pastosa exclusivamente midiática. E escrevo isso com a TV ligada no jogo do Brasil com a Inglaterra, inaugurando o superfaturado e sem charme “novo Maracanã”, sob a baba dos vermes Galvão Bueno e Ronaldo Gordo. Torcíamos com sinceridade. Os clubes tinham seus estádios ( a maioria deles), sua identidade, seus ídolos. A seleção, às vezes, desagradava. Mas, de modo geral, representava o torcedor. Era outro mundo. Para se ter uma ideia, o time da moda de hoje, que é apoiado pelo governo e está ganhando um estádio feito com dinheiro público e isenção fiscal nunca tinha ganho sequer um título nacional. Em “Amsterdã Blues”, até agora, o autor não falou de música. Mas em 1986 eu adorava Kiss, Iron Maiden, Black Sabbath, AC/DC. E vinham chegando Metallica, Slayer e outros. Curtir som pesado era quase heroico. Poucos discos lançados, com exceção das grandes bandas dos anos 70, e nada de camisetas e adereços que hoje são facilmente encontrados por aí. Eu ia a São Paulo para comprar discos. Esqueça o youtube. Clipes só no lendário Som Pop da TV Cultura. Vibrávamos a cada exibição de “Run to the Hills”, “I Love it Loud” e outros clássicos. Ver imagens do Metallica na TV, somente na época do “And Justice for All”, quando a banda começou a ficar desinteressante. Era difícil. E era legal pra caralho. Gostar de rock exigia doação, interesse, empenho. Por isso tudo, eu, velho e rabugento, me permito torcer contra a seleção da CBF e desejar que a tal da Copa seja um grande fiasco. Além disso, ainda fico puto quando vejo neguinho que se acha professor de roquenrou só porque tem uma camiseta do Ramones colocar no feicibuqui que tem um som do Charlie Brown Jr. ou do tal de Tijuana ou Detonautas que eu tenho que ouvir pra saber o que é um bom rock!!Que vão todos à merda ou que comecem a ler. “Amsterdã Blues” já seria um bom começo.