quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Fragmento de uma peça – Roy Orbinson ou Julio Reny?



Publico abaixo para deleite dos nossos milhões de seguidores um pequeno fragmento de um texto em que ando brincado nesses dias. Já tem umas 14 páginas e eu estou num momento da história em que já não sei para onde vão os personagens. Pensei em chamar a peça de “Roy Orbinson singing for the lonely” ou numa versão em português “Julio Reny canta para os solitários”. Ou outro nome qualquer. Esse ínicio é engraçado, ou tenta ser. O resto do texto, nem tanto. Nada demais, apenas um texto sobre um casal qualquer feito com “os olhos de borra de vinho”.

Hugo está sentado numa poltrona velha, no pequeno apartamento, em frente da televisão, com os pés num banquinho e uma cerveja na mão. A campainha toca e imediatamente a porta se abre e Gina entra apressada. Ele nem olha para ela.

GINA – Puta que o pariu, caralho, porque você faz isso? É a segunda vez e tô vendo que de novo não tem nada a ver. Só ta aí bêbado, vendo putaria na TV.
HUGO (finalmente olhando para ela e se indignando) – Que putaria o quê! Tô só zapeando.
G – Meu, por que você liga falando essas coisas? Caralho... assusta sabia? É uma maneira muito covarde de pedir para eu vir aqui.
H – Mas eu sinto isso... eu não tô legal mesmo.
G – Sinceramente Hugo... até entendo que você não tá legal. Na verdade, eu também não tô legal, acho que o mundo inteiro não tá legal. Mas ficar falando que vai se matar é uma coisa foda. Por pior que você esteja, realmente não parece alguém prestes a se matar.
H – Ah é? Então me conta... como que é a cara de alguém que tá querendo se matar? Você deve ser especialista no assunto.
G – Sei lá como é a cara de alguém que vai se matar, mas certamente não é a de alguém sentadão em frente a TV, tomando cervejinha, tranquilão aí.
H – Meu, então acabamos de decretar a inexistência do suicida tranquilo.
G – É isso mesmo. E ainda bem que não foi como no seu outro chilique em que eu liguei para a sua mãe, pra Nina, pra polícia e quase bati o carro tentando chegar aqui. Da próxima não vou bancar a palhaça de novo. Eu nem vou dar bola pro seu chororô.
H – Olha. Desculpa por te assustar. Eu não tava legal mesmo. Não quis dizer que eu ia me matar, entendeu? O que eu quis dizer é que eu tava sentindo uma grande vontade disso, vontade de sumir do mapa, entendeu?
G- E passou?
H- Ah... até passou. Liguei a TV, tomando cerveja e acabei pegando um trecho de um show muito louco do Iggy Pop... aí fiquei lá prestando atenção, o som era muito foda e ele cantava praticamente com a bunda de fora. Cê já viu esse show? Meu, como ele consegue cantar com aquela calça caindo, com a bunda de fora o tempo todo? Aí foi isso. Fiquei vendo o show e aquela angústia foi passando.
G – Já vi que o negócio era foda mesmo. Cê precisou de cinco minutos de bunda do Iggy Pop para esquecer os problemas.
H – Não foram cinco minutos não. Foi um show longo, bem legal...
G – Ah...vá se foder Hugo. Porra, vou nessa, você me mata de susto. Eu desvio meu caminho do que eu ia fazer, chego aqui e te vejo sossegadão vendo TV.
H – Porra, você preferia me ver cortando os pulsos?
G- Claro que não! Mas em vez de você ligar e pedir pra eu passar aqui bater um papo, que você precisa conversar e tal, você liga dizendo que vai se matar. Isso não é legal. Assusta a gente e... meu... eu tava no trânsito indo cuidar da minha vida.
H – Onde você tava indo?
G – Comprar tintura para meus cabelos e comprar um perfume novo. A Nina diz que tem uma vizinha dela que traz esses perfumes caros importados de contrabando e vende bem mais barato. Ia passar numa loja de cosméticos e depois ia lá na Nina ver as coisas da tal vizinha.
H – Por que isso?
G- Isso o que?
H- Porque você vai mexer no cabelo e comprar perfume? Tá rolando alguma coisa?
G- Tá rolando que eu sou mulher Hugo. Mulheres fazem essas coisas, sabia?
H- Seu cabelo tá bonito assim. E acho que você não precisa de outro perfume.
G- O que você sabe dessas coisas?
H – Ué... eu te olho...eu sinto teu cheiro. Acho teu cabelo bonito assim. Tá parecido com a época que eu te conheci, né?
G- É. Acho que eu tava usando assim mesmo naquela época. E o perfume?
H- Que é que tem?
G – Você gosta? Você nem sentiu o perfume que estou usando.
H- Meu... você cheira bem. Mulheres normalmente cheiram bem. Se você for me pedir uma análise técnica do teu cheiro eu não sei dizer. Mas é perfume de mulher. Cheiro bom...
G – Ah... até parece...cada mulher usa seu perfume, cada mulher tem um cheiro. Esse papo de perfume de mulher é furado.
H- É nada Gi. Vocês mulheres é que viajam nessa história. Pergunte para todos os homens. A maioria, talvez fora esses boyzinhos de hoje em dia que são vaidosos pra caralho, metrossexuais e tal, os homens não sabem dizer muito sobre os cheiros, mas sabem que as mulheres, pelo menos as interessantes, cheiram bem. É cheiro de mulher saca? Pô... não tem o filme com o Al Pacino? É “Perfume de Mulher”. Se fosse “Perfume Chanel n° 5” ou outro nome, não teria graça. Mulher cheira mulher. Assim como homem cheira homem.
G – Nunca ouvi bobagem tão grande. Existem milhões de sutilezas nos perfumes das mulheres. Além de perfumes, usam cremes, óleos, xampus, desodorantes ínitmos...
H- Aí... ta vendo? Desodorante íntimo. Meu...eu nunca fui capaz de identificar alguma mulher usando os tais desodorantes íntimos. Para mim, buceta tem cheiro de buceta. Nunca senti isso e nunca vi, nos papos de homem, alguém dar importância ao cheiro da buceta, se ele for normal claro, não tiver cheirando suor, menstruação ou outra nojeira qualquer. Buceta cheira buceta. É igual cheiro de Fusca. Não adianta colocar aqueles sachezinhos idiotas. Fusca cheira Fusca.
G – (rindo) Cara... ainda bem que eu consigo rir desses teus absurdos.
H- É porque você nunca deve ter andado de Fusca.
(To be continued)

6 comentários:

DUDU disse...

Muito bom!

DUDU disse...

Muito bom!

Anônimo disse...

Belo texto, belo texto... estou curioso pelas outras páginas, que disseste que tens. Gostaria de lê-las. Acabei lendo um outro mais abaixo, de um cara que vai ver uma garota, que planeja sair nua do chuveiro depois que ele entrar no ape, o porteiro avisado etc. Belo texto, belo desencontro, belo conto. Idéia bem fechada em algumas páginas. Você fala dessa indeterminacao de para onde vao os personagens, interessante isso.

Passo aqui outra hora para ler mais.

Parabens pela excelente escrita !

Sérgio disse...

Valeu. Abraço.

Anônimo disse...

Ae Sergio, depois que o Bortolotto diz q vai parar com o blog dele o único q salva na net é o seu...Não deixa a bola cair não. Vc é tipo: o último Jedi,e muito bom nos seus textos...Grande abraço.

Anônimo disse...

Pô, legal mesmo, bons diálogos, posta o resto aí, se rolar. abraço.
Kleber Felix.