terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Bukowski e o caderno manchado de vinho



Li “Cartas na Rua” com os meus 14 ou 15 anos de idade numa edição do Círculo do Livro. Nunca havia ouvido falar em Bukowski, mas me interessei pela sinopse publicada na saudosa “Revista do Livro”. Eu já tinha um gosto pelas coisas meio “gauche” na vida. Já tinha lido “Feliz Ano Velho” do Marcelo Rubens Paiva que foi o livro que despertou em mim e, creio eu, em alguns amigos daqueles tempos, a vontade de ser algo mais do que qualquer coisa que as mães planejassem para os adolescentes da vila em que eu cresci.
Eu e alguns desses meus amigos demos muitas voltar por aí. Talvez hoje todos sejamos a tal coisa que as mães planejaram. Mas pelo menos crescemos com o gosto pela experimentação. E experimentamos. E curtimos. Não sei se meus velhos chapas vão concordar com minhas interpretações do que aconteceu nos nossos felizes anos velhos. Qualquer dia escrevo sobre isso. Voltemos ao velho Buk.
Pouco tempo depois li “Mulheres”, na tradução do Reinaldo Moraes, publicado pela Brasiliense numa série de livros eróticos denominada Brasiliensex. Além de enredo para centenas de punhetas, “Mulheres” serviu para abrir minha percepção para a poesia amarga por trás da prosa seca e endiabrada de Bukowski. E fiquei fã do cara. Nem li tantos livros dele assim, mas é sempre um autor que me empolga.
Bukowski hoje tem uma aura de rock star entre uma certa galera. Seu nome trafega pelos papos das mesas dos bares rock´n roll ao lado de Keith Richards ou Jim Morrisson. Eu mesmo tenho uma camiseta com a cara dele. Mas o velho estava em outra. Bukowski gostava mesmo é de música erudita, tão importante pra ele quanto o goró, as corridas de cavalos e as mulheres. Mais importante que tudo isso, a literatura.
O velho escreveu muito. Poemas, contos, romances, resenhas de livros e até uns ensaios meio toscos sobre literatura. “Pedaços de um caderno manchado de vinho” tem um pouco disso tudo, menos os poemas.
São textos menos conhecidos publicados em revistas, desde as de literatura até as pornô, além de prefácios, colunas de jornais, enfim material esparso, agora devidamente reunido à sua obra.
Gostei de ler “Pedaços de um caderno manchado de vinho”, principalmente as reflexões sobre literatura. Bukowski se diz fã de Celine, Dostoiévski e, principalmente Turgueniev. Gosta de Allen Ginsgerg, tem uma relação ambígua com Hemingway e detesta Faulkner. Confesso que não sabia dessas opiniões. O que sei é que Bukowski é bom pra caralho.
Transcrevi três pequenos trechos abaixo. Selecionei outros mas fiquei com preguiça de digitar aqui. É o Chinaski de sempre:

“Bêbado outra vez num quarto do tamanho de um pacote de biscoitos, sonhando com Shelley e juventude, barbudo, um filho da puta desempregado com uma carteira cheia de bilhetes premiados tão impossíveis de reembolsar quanto os ossos de Shakespeare. Todos odiamos poemas de comiseração e lamúrias de um pobre sofredor – um bom homem pode vencer qualquer parada e saudar a prosperidade (assim nos disseram), mas quantos homens de valor você consegue apanhar num jarro hermeticamente fechado? E quantos poetas de qualidade você consegue encontrar na IBM ou roncando sob os lençóis de uma prostituta de cinqüenta dólares? Mais homens de valor morreram pela poesia do que todos os seus campos de batalha de merda; então se eu cair de bêbado num quarto de quatro dólares: você já ferrou com sua história – deixe que eu me vire com a minha”.

E tendo observado meu pai, aquele monstro brutal que abastardou minha experiência sobre esta triste terra, percebi que um home podia trabalhar a vida inteira e ainda assi continuar pobre; seus vencimentos se consumiam na compra de coisas que ele precisava, pequenas coisas, como automóveis e camas e rádios e comida e roupas, pelas quais, como as mulheres, pediam mais do que valiam e o mantinham pobre, e até mesmo seu caixão foi um ultraje final à decência: toda aquela bela e lustrosa madeira para os cegos vermes do inferno”.

“Estamos cercados pelos mortos que ocupam posições de poder porque, de maneira a obter esse poder é necessário que morram. Os mortos são fáceis de encontrar – estão por toda a parte a nossa volta; a dificuldade está em achar os que estão vivos”.

5 comentários:

Arroto Feminino disse...

aqui tbm, muito interessante!

diego moraes disse...

Buk é gênio.

Zaratustra disse...

O único livro de poemas dele em portugues que achei tem uma tradução sofrível. Arrumei um original, com quinhentas paginas de poesia... as palavras nao bastam, o cara é forte.

Anônimo disse...

Porra brother, esse eu ainda não consegui comprar, tá na lista, legal ler uns trechos só pra estigar. abraço.Kleber Felix

Juliana Calaes disse...

Estou bem da viciada em Bukowski ultimamente...