quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O PEDRO MALASARTES HARDCORE



Acabei de ler o fodaço “Pornopopéia”, um livro com poucas referências ao rock e até a outros tipos de música, mas que pode ser classificado como “rock´n roll” naquilo que a expressão desgastada tem de melhor. Ou seja, é um livro intenso, bem humorado e transgressor. Uma sucessão de cenas de sexo, drogas e canalhice protagonizada por um cineasta maldito e fracassado em sua descida inconsequente ao fundo do poço.
Reinaldo Moraes escreveu na década de 80 “Tanto Faz” um pequeno livro que influenciou dezenas de escritores da atualidade. Lançado pela série “Cantadas Literárias” da Editora Brasiliense, o livro conta a história de um estudante de economia que ganha uma bolsa para estudar em Paris. Chegando lá, deixa a carreira acadêmica de lado e cai na vida. Apesar dos excessos, o livro também tem um fundo autobiográfico. Reinaldo Moraes também largou a economia, mas caiu, de vez, no universo das letras.
Juntamente com o cartunista Caco Galhardo e a blogueira Ana Pands, ele apresenta o programa “Fogo no Rádio”, podcast que vai ao ar pela Rádio UOL. Os três recebem convidados para entrevistas absurdas ou tratam de temas interessantes com altíssimas doses de nonsense, ironia e piadas de todos os tipos de calão.
Além do cultuado “Tanto Faz”, Reinaldo Moraes já lançou Abacaxi (L&PM, 1985), o romance para jovens “Órbita dos Caracóis” (Cia. das Letras, 2003) e a coletânea de contos “Umidade” (Cia. das Letras, 2005).
“Pornopopéia” tem 475 páginas e levou quinze anos para ser escrito. Em entrevistas, Reinado tem comparado seu personagem principal, o cineasta Zeca, a um Pedro Malasartes aprontando das suas em meio ao caos urbano de uma São Paulo decadente, entre traficantes, prostitutas, publicitários esnobes, policias corruptos, adolescentes maluquetes, travestis e espiritualistas chegados demais aos prazeres da carne.
A história começa quando o ex-cineasta marginal, autor de um único longa metragem, o obscuro “Holisticofrenia” (“premiado na Colômbia”), sem dinheiro para manter o status de “criador alternativo” é obrigado a filmar um vídeo institucional sobre embutidos de frango.
Ao invés de procurar pelas idéias, Zeca chuta o balde e entra numa espiral de excessos sexuais e lisérgicos de todos os tipos. A exemplo do seu personagem, Reinaldo também apostou na falta de filtros e regras para contar sua história. A torrente de palavrões é tão grande quanto a quantidade de enrascadas, contravenções e pequenas canalhices em que o personagem se mete em sua obsessão por prazer.
O livro provoca muitos risos, principalmente na primeira parte. Reinaldo é um artesão que constrói seu texto caudaloso e verborrágico com esmero, utilizando grande talento e elaboração pra relatar as impagáveis aventuras (ou desventuras) de seu herói sem caráter, o Pedro Malasartes hardcore. Só a “surubrâmane”, orgia realizada num templo erótico-religioso, em que Zeca se mete consome 80 páginas de descrições tão picantes quanto engraçadas.
Em sua epopéia pornográfica regada a todos os tipos de substâncias ilegais, Zeca é um personagem que representa um pouco a era de individualismo exacerbado e busca de prazer a qualquer custo, apenas pelo próprio prazer, em que vivemos. Por isso, a coisa que o personagem mais faz, além de copular e consumir drogas, é dar de ombros para o que os outros podem pensar ou sofrer com suas atitudes.
Ao final do calhamaço, o que provocou riso por tantas páginas passa a se transformar em desconforto ou pena ou raiva ou outra coisa qualquer. Ler “Pornopopéia” pode ser uma experiência intensa. Exige leitores dispostos a tal.

Um comentário:

Anônimo disse...

reinaldo moraes é gênio. o cara tem uma sacada do caralho por página.

não sabia desse podcast. valeu a dica!