terça-feira, 12 de outubro de 2010

A morte de Bunny Munro


O australiano Nick Cave é uma das figuras mais interessantes surgidas nos anos 80. Seu som, ora vibrante ora melancólico, trazia cargas de Velvet Underground, punk rock e o blues mais profundo das estradas desoladas de uma América imaginária. Suas letras passeiam por temas como crimes, presságios, religião, culpa, pecado, redenção, sofrimento e delírios místicos de todas as espécies.
Em “A Morte de Bunny Munro”, seu segundo romance, editado no Brasil pela Record, há um pouco de tudo isso. E também há o humor negro frequentemente utilizado por Cave. A novidade é que no livro há sexo em várias modalidades: amargo, caótico, trágico e outros.
Bunny Munro, o personagem principal, é um vendedor de produtos de beleza que não perdoa nada que pareça vagamente feminino. Qualquer breve diálogo com uma cliente ou a visão de uma garota, que nem precisa ser bonita, desperta o monstro insaciável que descansa em suas cuecas de oncinha.
E Bunny segue pela vida tentando comer todo mundo, sonhando com as vaginas milionárias e bem tratadas de Avril Lavigne e Kylie Minogue, até que sua mulher Libby, cansada da solidão e do desprezo do marido coloca um fim na própria vida.
Sobra para nosso priáprico herói cuidar de Bunny Jr., o filho de nove anos sensível e inteligente, e fugir dos fantasmas que agora assombram sua mente doentia, enquanto tenta continuar a foder qualquer coisa que aceite receber o seu pau.
A lenta desintegração mental de Bunny é uma tragédia com cara de road movie com final épico e redentor. É um romance. Mas poderia ser uma balada estrondosa de Nick Cave ao piano. Daquelas que retratam os condenados debatendo-se nas jaulas do destino.
Passeie com Bunny Munro:

“Bunny acena para uma esportista de iPod e malha de lycra anti-impacto que talvez acene de volta; uma negra saltitando pelos gramados em um Pogobol amarelo; uma colegial seminua com um chupão do tamanho de um biscoito na base da coluna que acaba se revelando uma tatuagem maravilhosamente linda de um laço ou de um arco e flecha.
- Já veio embrulhada pra presente? – grita Bunny. – Nem acredito! – Em seguida assobia para uma garota completamente nua e totalmente depilada, mas que, após olhar mais de perto, Bunny percebe estar usando um fio dental cor de pele tão anatomicamente integrado ao seu corpo quanto a pele de uma lingüiça; ele acena para um trio de deusas coxudas que usam botas Ugg e brincam de jogar vôlei com uma enorme bola laranja e azul (elas acenam de volta em câmera lenta). Bunny buzina para um casal de sapatas surpreendentemente gostosas, que lhe mostram o dedo médio, ao que ele ri e as imagina se comendo com paus de plástico amarrados na cintura; depois, vê uma garota de tranças e joelhos virados para dentro lambendo um pirulito listrado azul e vermelho; uma menina usando algo indefinível que dá a impressão de que ela vestiu a pele de uma truta arco-íris; em seguida, vê uma babá, ou algo do gênero, se inclinando sobre um carrinho de bebê e a bela marca de sua calcinha, o que o faz soprar ar por entre os dentes e socar a buzina. Por fim, nota uma secretária ossuda de aparência desolada com uma blusa que diz “GUINCHE COMO UM PORCO” e carregando um enorme pênis inflável. Bunny confere o relógio, reflete por um momento, mas segue em frente. Vê uma garota esquisita, usando um véu e um biquíni com anquinha estilo vitoriana, depois acena para uma junkie bonitinha bem parecida com Avril Lavigne (o mesmo delineador preto os olhos) sentada em uma pilha de revistas Big Issue na soleira dos hotéis Embassy, que estão caindo aos pedaços. Ela se levanta e anda trôpega na direção dele, esquelética, com dentes gigantes e olheiras pretas sob os olhos, como um panda, e então Bunny percebe que ela não é uma gatinha junkie, e sim uma famosa supermodelo no auge do sucesso cujo nome ele não consegue lembrar, o que faz sua ereção saltar na cueca, mas quando a vê mais de perto ele descobre que é, de fato, uma gatinha junkie e segue em frente, embora qulaquer um que goste desse tipo de coisa saiba, mais do que qualquer outra coisa no mundo, que junkies são as melhores boqueteiras ( e as putinhas viciadas em crack as piores). Bunny liga o rádio e “Spinning Around”, o hit de Kylie Minogue começa a tocar, e ele não consegue acreditar na própria sorte e sente uma onda de alegria quase ilimitada à medida que os sintetizadores pesados e provocantes começam a sair das caixas e Kylie vocifera seu panegírico orgiástico à sodomia e El pensa no short dourado e apertadinho dela, aquelas esferas cor de ouro, e isso o lembra de estar comendo a bunda grande e pálida de River, a garçonete, lá no quarto de hotel, com a barriga cheia de salsichas e ovos, e então começa a cantar junto com o rádio e a música parece estar saindo de todas as janelas de todos os carros do mundo, e a batida pulsa forte pra caralho. Então ele vê um grupo de ratas de shopping atarracadas com suas barrigas sensuais e seus batons cintilantes; uma garota árabe em burca completa potencialmente gostosa (puta merda, lábios da Arábia); e então um outdoor anunciando sutiãs Wonderbra ou algo do gênero e diz “Uhu!”, dando uma guinada perigosa no volante enquanto aperta a buzina, voltando para a Forth Avenue e já desenroscando a tampa de uma amostra de creme para as mãos. Ele estaciona e bate uma punheta, com um sorriso grande e feliz no rosto, gozando em cima da meia incrustada de porra que mantém debaixo do banco do carro.
- Ah! – exclama Bunny, e o DJ no rádio está dizendo: “Kylie Minogue; quem não adora aquele short apertadinho?!” E Bunny diz: - É isso aí! – Manobrando o Punto na direção do tráfego e guiando os dez minutos que o saparam do seu flat na Grayson Court, em Portsland,ainda sorrindo e gargalhando e se perguntando se sua mulher Libby vai estar a fim quando ele chegar em casa".

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