sábado, 25 de fevereiro de 2012

Carnaval com pedras e filmes

Que o carnaval é uma bosta todo mundo sabe. Pra mim, nesse ano, foi especialmente chato. Passei boa parte dele num hospital sem poder sequer ler durante a internação. O bendito Buscopan despejado nas minhas veias para controlar a minha enésima pedra no rim embaralhava toda a vista.
Mas ainda me sobrou a terça-feira que eu aproveitei muito bem. Consegui ver três filmes da leva que baixei do Arapa Rock Motor (com links aí do lado).
O primeiro deles foi “Foxy Brown”, clássico da blaxploitation de 1974, com a Pam Grier (que Tarantino resgatou do limbo em Jackie Brown) no auge da gostosura, desfilando pernas e peitos magníficos. É impressionante como o filme é violento para a época. Aliás, se fosse lançado hoje seria extremamente polêmico e levaria pauladas das vestais politicamente corretas. Uso de heroína e cocaína, estupro, um cara triturado pela hélice de uma avião, um queimado vivo e outro castrado pela Pam Grier, além de muita porrada e ofensas raciais.
Não conheço muita coisa da blaxpolitation. Já tinha visto “Coffy”, também com a Pam Grier. Gostei dos dois. Me lembram filmes policiais baratos que a Record exibia durante a semana, no fim de noite, lá pelo início da década de 80. O curioso é que esses dois que eu citei são dirigidos pelo diretor Jack Hill. Branco até o caroço.


Depois de “Foxy”, emendei com “Two Lane Blacktop”, de 1971. É a versão “muscle car” dos “biker movies”. Dirigido pelo esquisitão Monte Hellman, tem no elenco James Taylor (sim, sim, o cantor de “You´ve Got a Friend”), o canastrão mor de filmes B dos anos 70, Warren Oates e Dennis Wilson, baterista dos Beach Boys. Além de uma ponta de Harry Dean Stanton como o caronista cowboy gay.
É um road movie estranhão, como tudo que vi do Monte Hellman. Mas é muito legal. Planos longos, uma América desolada, corridas de carro que parecem ser o objetivo de vida dos personagens mas que, quando são mostradas, parecem insignificantes diante do vazio da vida dos caras. Uma certa atmosfera de “sonho acabou”. Nos créditos, os personagens são identificados como The Driver, The Mechanic , The Girl e GTO (Warren Oates, identificado pelo modelo do carro). A sinopse no Arapa chama de “Road movie existencial”. O fim é do filme é do caralho. Recomendo muito.


Por fim, vi “When You´re Strange”, documentário sobre o The Doors, dirigido por um tal Tom Dicillo e narrado por Johnny Depp. Achei o filme muito foda. Várias imagens que eu nunca tinha visto, de shows e ensaios da banda. Várias coisas são interessantes no filme: uma tentativa de dissecar o som da banda, uma valorização da participação de John Desmore e Robbie Krigger e uma certa postura crítica em relação a Morrisson, muito comumente tratado como gênio ou “poeta maldito”. O documentário deixa tudo em aberto. Você pode achar Morrison um poeta angustiado e perturbado pelos seus próprios demônios ou simplesmente um rockstar narcisista que enfiou o pé na jaca do sucesso, como tantos outros.
Os Doors foram uma das bandas que mais ouvi na adolescência. Tinha montes de fitinhas Basf amarelinhas com os sons todos. Ouvi muito e a turma que eu andava na época também. Lembro de finais de semana na chácara de um amigo onde rolava muito Doors e Vodka Popov, a mais barata que havia. Muitos porres gestados numa atmosfera de “Break on the Trough”, em plena terra de Tonico e Tinoco. Bons e ingênuos tempos.
Acho que o bode com a banda começou junto com a febre desencadeada pelo filme do Oliver Stone. Aí virou meio carne de vaca demais. Tanto que hoje acho que tenho apenas dois Cds ao vivo do Doors e nenhum vinil. Mas sei cantar quase todas as letras mesmo sem ouvir há milênios. Depois do documentário fiquei com muita vontade de ter o “Morrison Hotel” e o “L.A. Woman”, principalmente. A música “L. A. Woman” é a minha preferida da banda. O vídeo postado era um clipe que tinha num VHS chamado "Dance on Fire" que aluguei mil vezes quando era moleque. O áudio desse VHS foi minha primeira fitinha dos Doors. Mr. Mojo Risin`!

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Dylan


Bob Dylan no Brasil em abril. Fiquei querendo torrar os trocos do pão nosso de cada dia e meter a cara. Gasto tanta grana com remédios e tal, por que não gastar vendo o cara mais foda de todos os fodas do rock? I ain´t gonna work on Maggie´s farm no more.
Minha primeira lembrança de Dylan é ver a capa de “Infidels” na saudosa Discoteca da Cidade. Também via aquela capa na casa de um primo meio hippie. Eu era moleque, metaleiro, fã do Kiss e do Iron Maiden. Dylan era um clássico que me deixava curioso, mas parecia “música de adulto” demais.
Até que um dia comprei aquela bela coletânea “Greatest Hits” num supermercado em São Vicente, do lado da casa de uma tia. Gostei de cara. Teve uma vez que a Bizz publicou um livrinho com várias letras traduzidas, se não me engano quando Dylan veio para o Brasil a primeira vez.
Outra lembrança forte é de uma fitinha com o “Before the Flood” que foi trilha sonora de uma tremenda dor de corno nos meus tempos de faculdade. Ouvia “Don´t Think Twice” e “Just Like a Woman” e me sentia um pouco vingado.
Nos tempos de faculdade também consegui coisas legais pra caralho numa loja de discos estranha que tinha perto da estação ferroviária de Bauru. Eram os idos de 92. Comprei lá, em vinil, o “Desire”, o “Live at Budokan” e o “Highway 61 Revisited”. Também comprei vários do Bowie nessa loja. Os discos pareciam novos, mas eram vendidos a preço de usados. Nessa época ouvia muito o “Nashville Skyine”. O dueto com Johnny Cash é de arrepiar até hoje.
Meus preferidos do Dylan são o “Desire”, o “Time Out of Mind” e o “Blood on the Tracks”, mas putaqueopariu, gosto de quase tudo do cara... o filme Don´t Look Back é do caralho, tudo dos anos 60 é foda. Gosto muito dos últimos discos também. Do “Time Out...” pra cá. Nos 70 e nos 80 tem umas coisas mais fracas, mesmo assim tem discos muito fodas, como os que eu já citei, o “Basemet Tapes” e o “Oh Mercy”.
Meu irmãozinho Pedro( the german caveman) me deu o “Crônicas” é eu devorei. É do caralhíssimo. Fundamental pra você entender a arte do cara. Comprei a biografia do Howard Sounes, mas ainda não li.
Na última vez que fui na Galeria do Rock, comprei uma caixa com os dois CDs e mais um DVD do Traveling Wildburys, a banda que Dylan teve nos anos 80 com George Harrison, Roy Orbison, Tom Petty e Jeff Lyne. É muito legal também.
Se o mundo do rock está cheio de “guitar heros”, Dylan é o exemplo perfeito de “poetry hero” na música. Lembro de uma reportagem sobre ele numa velha Playboy cujo título era algo do tipo “Palavras com a força de um trovão”. Não sei se é isso mesmo, mas o fato é que seu texto pode ser incandescente, seja nas canções mais políticas, nas místicas/messiânicas ou nas de amor. Mesmo assim, o pé no aspecto mais tradicional da canção popular está sempre lá. O próprio trabalho com o Traveling Wildburys mostra isso.
Ouvindo os primeiros de Dylan, a série Bootleg e os discos “Good as I Been To You” e “World Gone Wrong”, além da leitura do “Crônicas”, dá Ra perceber o quanto o cara conhece da tradição musical americana. Dylan ouviu muito os mestres do passado e conseguiu, em certa medida, reinventar essa música. Isso não é pouca coisa.
Agora é esperar pra ver o preço dos ingressos e torcer pra não ter nenhum show desastroso de abertura. Lembro alguns casos clássicos de trapalhadas dos promotores em shows que vi: o patético Angra abrindo para o AC/DC no Pacaembu, em 1996 e um ex-sertanojo (Edson, Hudson, Ibson?) com uma bandinha cover do Guns and Roses (com vocalistinha de bandana e tudo) abrindo para o ZZ Top. Já pensou ver a Mallu Magalhães ou o Capital Inicial abrindo para Dylan? Um show do Julio Reny seria demais, né? Mais aí já é superfaturar o milagre...
Quem sabe, ainda esse ano, alguém se anima a trazer o Tom Waits, o Bruce Springsteen e o Leonard Cohen?

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Poema pobre pensando em Sérgio Sampaio


Beatles nos fones de ouvido
Blues e diamantes sob os arcos da Lapa
Em velhos verões
Os navios fantasmas na Baía da Guanabara
Fogem dos olhos
Entre trevas, poemas e os gols do Fantástico
Um gosto de samba com sangue
De Copacabana até as sombras do mangue

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Embalosde sábado na madrugada



Depois que um pernilongo sugou meu sangue entupido de remédios por um dos dedos do pé resolvi levantar de vez da cama e levar minha agonia para perambular pela casa. Tive vontade de ouvir “Just Like a Woman” na bela versão do “Before the Flood”, mas o povo dorme aqui em casa. Um amigo arranjou um novo amor e isso me deixou feliz. Um novo amor em Viena parece até título de filme com o Fred Astaire. Por aqui, sigo e vou. Parece que tem uma espada atravessando meu pescoço. Ganhei um cd de relaxamento que, dizem, vai me ajudar. Mas eu não tenho coragem de colocar pra tocar um cd de relaxamento. Meus rins seguem aos trancos e barrancos. Faz calor pra caralho. O documentário sobre o Paulo Francis que acabei de assistir terminou de forma melosa e lamentável. Hoje tentei nadar à tarde mas não consegui. Tudo no meu corpo parece estar precisando de ajustes. Como se não bastasse a velha mente que não desliga e também não resolve porra nenhuma. Tenho vontade de ficar sozinho num mosteiro ou algo assim, isolado do mundo. Paira misteriosa a velha sombra. O trabalho começou e o bode também. As pessoas são capazes de ouvir uma música onde o cara se declara orgulhosamente “bruto, rústico e sistemático” e dispara, orgulhosamente e em mau português proposital, patadas em gays e mulheres. O Reinaldo Moraes tá certo. A carneirada ganhou o jogo. Eles não sentem mais vergonha de serem estúpidos e ignorantes. Agora ofendem quem ousa ser diferente. Lembro de um moleque de 22 anos que trabalhava ao meu lado me ridicularizando porque eu lia um livro. E pior! Um livro escrito por uma mulher! Era o “Só Garotos”, da Patti Smith. Acabo de ver um especial sobre o Chico Science na MTV e fiquei lembrando dos anos 90. Saudades de velhos amigos. Saudades das tantas coisas que não fui. Ainda não ouvi o vinil do Tom Waits que comprei num sebo da galeria. Comprei a trilha sonora de “Shaft” também. Baixei “Chet Baker in New York”, de 1958. No meio desse turbilhão mental misturado com decadência física acelerada, duas decisões: Vou retocar minha velha tatuagem e começar a ler “A abadessa de Castro”, de Stendhal. Amanhã jogo bola com meu filho no quintal até os 12 do primeiro tempo, que é enquanto aguento. Andei reouvindo Sérgio Sampaio por conta de um vídeo que vi no blog do Ademir Assunção. Parece que vai sair um documentário sobre ele que, aliás, é padrinho desse malfadado blog (vídeo abaixo). Um gênio perdido. Ouço as maravilhas que ele fez e fico imaginado o cara desfilando pelas ruas do Rio na década de 70. Tocando e tentando achar o seu lugar. A cidade maravilhosa alegre e também sombria naquele período. A música cheia de dor, beleza, humor e um lirismo intenso não cabia nos ouvidos do povão. Sampaio era e se considerava um cantor popular. E não bateu pro povo. Deve ter sido foda a trajetória de maldito até o fim. Faça algo de bom por você: saia daqui e vá ouvir Sérgio Sampaio! As pessoas são uns lindos problemas.